Os ambientes de treino mais convenientes nem sempre são os melhores, por Dr. Matt Jordan



Matt Jordan PhD é  um estimado parceiro da Elite Training, inclusive uma das pessoas que mais incentivou esse blog.

O premiado canadense é Diretor de Força e Condicionamento do Instituto Canadense do Esporte e também Diretor de Ciências do Treinamento para Esportes de Inverno do Canadá.

Trabalha diariamente com atletas de nível mundial, tanto no laboratório, quanto na sala de treino e no campo e um pesquisador/treinador renomado mundialmente.



Os Ambientes de Treino Mais Convenientes Nem Sempre São os Ambientes Ótimos.

Meus Domingos de manhã são tipicamente reservados para atualizar o Blog, ler artigos e os acontecimentos do universo da ciência do esporte.

Durante a semana eu direciono o foco mais na geração de novos conhecimentos através das minhas próprias pesquisas e me atualizando com as literaturas científicas.

Um dos artigos no qual me deparei essa manhã tinha o seguinte título: Restrição Calórica, Hormense e o que isso nos ensina sobre a evolução. O artigo, escrito por Josh Mittledorf, oferece uma simples e digerível leitura sobre um processo contra intuitivo de hormese que sugere que a ausência de estresse   tende a diminuir a vitalidade de organismos vivos e que a vida tende a ser muito melhor na presença do estresse. 

Na questão da restrição calórica, existem muitos exemplos onde privar um ser vivo de alimento, pode realmente estender sua expectativa de vida.

Pessoalmente eu vejo essa observação de estender minha própria expectativa de vida inclusa em meus assuntos pessoais e profissionais. Quando paro para refletir, é interessante notar que meus maiores níveis de produtividade e satisfação aconteceram quando minha vida pessoal e profissional estava menos confortável.

Eu prosperei nesse ambiente mesmo em um momento no qual eu me virava na cama por me sentir estressado. Comparativamente, um dos momentos no quais eu me sentia menos satisfeito ocorreram quando as coisas estavam relativamente fáceis.  

Eu acredito que o conceito de hormese também se estende para o ambiente de treino que criamos para nossos atletas. A tendência de muitos esportes de equipe ou sistemas esportivos é a de identificar as maneiras de se remover os fatores de estresse para o atleta. Construímos ambientes de treino perfeccionistas, com todo o conforto de uma casa, implementamos planos alimentares, desenvolvemos grades horárias para que o atleta possa direcionar mais energia para o treinamento e geralmente as avaliações são feitas para se obter um feedback subjetivo para garantir que estamos dando ao atleta aquilo que ele quer. 

Pense na rápida emergência da disciplina da Ciência da Regeneração – é curioso notar que essa queda brusca na resposta ao estresse, na verdade diminui a resposta ao treinamento em muitos estudos. Eu ainda estou para ver um local de treino recentemente construído que não tenha uma área de regeneração que esteja regularmente cheia de atletas. 

Enquanto existem exceções, a maioria dos centros de treino que eu visito são – em geral – muito mais convenientes e livres de estresse se comparados aos  que visitei ao longo dos anos 80 e 90. 

No entanto, a questão é: estão as tendências de  remover o estresse da vida do atleta e do ambiente de treino relacionados com um atleta mais forte, veloz e resiliente?

Não consigo pensar em exemplos específicos nos quais essa resposta seria um “sim”, mas esses seriam atletas maduros que passaram pelas fases difíceis do esporte de elite e entendem que o objetivo não era de tornar as coisas confortáveis. Pelo contrário, não remover alguns desses estresses de seu ambiente de treino tornavam eles mais aptos a aguentar as situações desconfortáveis.

Eles sabiam, intuitivamente, que as coisas não eram sobre tornar tudo mais fácil. 

Por outro lado, atletas que não compreendiam os aspectos do que era necessário para ser o melhor pareciam estar perdidos quando treinavam nesse ambiente “ótimo”. 

Eu consigo lembrar de diversos atletas de alto nível nos quais a performance parecia realmente sofrer as consequências quando seu ambiente de treino se tornava progressivamente mais fácil. 

Eu também penso nos atletas que cresceram em um mundo emergente, em ambientes de treino livres de estresse que nunca tiveram que desenvolver a resiliência que seus antecessores demonstravam. 

Outra reflexão interessante é sobre alguns atletas que, por qualquer razão, perderam sua chance de treinar em ambientes “ideais” de treinamento. Eu sempre me surpreendi que contrariamente as expectativas (ex: o atleta perde a oportunidade de treinar no “melhor ambiente” e o desempenho despenca) os atletas na verdade foram capazes de demonstrar resultados exatamente opostos – eles melhoraram! 

Seria como se,  desafiar os níveis de conforto e tornar as coisas mais difíceis fossem elementos necessários para que a performance pudesse melhorar. 

Como é possível que um atleta que esteja sendo privado dos “melhores ambientes de treino do mundo” e entra em um ambiente de estresse e incerteza, nesse momento descobre seu potencial?

Pense sobre o conceito de hormese e se pergunte: como eu programo para aumentar o  “Quociente de Desconforto (QD)” do meu atleta?

Na área acadêmica existe o quociente de inteligência (QI) e nas ciências sociais existe o quociente emocional (QE). 

Ambos são considerados fatores chave para o sucesso ou indicadores de performance.  Eu argumentaria que o Quociente de Desconforto é um indicador de performance para atletas de elite, treinadores e equipes. 

Seria nossos instintos e tendências naturais para buscar eficiência, tornar a vida mais fácil e potencializar o conforto em nossa sociedade um desserviço para a performance de um atleta no caso de aplicarmos essa mesma lógica? 

O objetivo é a criação de um atleta robusto e autoconfiante que seja verdadeiramente confortável em estar desconfortável. Mas como iremos dar suporte para se estamos constantemente procurando tornar as coisas mais fáceis?

Similar aos potenciais benefícios do estresse, tais como a restrição calórica com o objetivo de estender a expectativa de vida, eu acredito que haja benefícios importantes que podem ser obtidos pela manutenção de estresses não relacionados a treino no ambiente de treinamento

Eu penso que tudo se resume na filosofia do programa. A conclusão é que não devemos ter medo de expor nossos atletas aos fatores de estresse.

E devemos ser conscientes de que lutamos com nossa intuição e realmente nos esforçamos para manter esses estresses e quantidades razoáveis em nossos ambientes de treino.


 

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